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Liberdade aos 42

Liberdade aos 42

16
Set19

Sobre o SNS...


Ontem, 15 de Setembro, assinalaram-se os 40 anos da criação do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Hoje, gostaria de partilhar convosco (com os que tiverem paciência para ler), um artigo que escrevi, em 2014 (e publiquei no jornal onde, à data, escrevia artigos de opinião), a propósito do 35º aniversário do SNS.

 

"35 anos de SNS… que futuro?!...

Celebra-se, a 15 de Setembro de 2014, o 35º aniversário do Serviço Nacional de Saúde (SNS), instituído pela Lei nº 56/79, de 15 de Setembro, que criou uma rede de órgãos e serviços prestadores de cuidados globais de saúde a toda a população, através da qual o Estado salvaguarda o direito à protecção da saúde.

Até à criação do SNS, a assistência médica competia às famílias, a instituições privadas e aos serviços médico-sociais das Caixas de Previdência. Em 1974, com a Revolução de Abril, surgem as condições políticas e sociais que vão permitir a criação do SNS.

35 anos volvidos, num clima de crise que parecer não ter fim à vista, em que a palavra de ordem é “cortar”, é altura de fazer um balanço e de traçar perspectivas de futuro. Para tal, importa analisar alguns dados objectivos…

Ao contrário do que afirmam os nossos governantes, Portugal não gasta muito com a saúde nem com o SNS. Em 2011, a despesa com a saúde (por habitante) correspondia, apenas, a 78% da média dos países da OCDE (e apenas 61% era despesa pública) e os EUA – país da saúde privada – gastam 3,2 vezes mais, por habitante, que Portugal e têm piores indicadores de saúde. Mesmo gastando menos que outros países, os nossos indicadores de saúde são melhores: entre 1970 e 2011, a esperança de vida aumentou, em média, 10 anos nos países da OCDE, mas em Portugal subiu 13 anos. A esperança de vida em Portugal, em 2011, era de 80,8 anos e nos EUA (nação da saúde privada, que gasta 3,2 vezes mais, por habitante), era de 78,7 anos. Outro indicador que nos deve orgulhar é a mortalidade infantil, inferior à média da OCDE e muito inferior à dos EUA [dados da OCDE].

Desde 2009, temos vindo a assistir ao “estrangulamento” financeiro do SNS, muito provavelmente, com o firme propósito de o desmantelar e destruir, porque, sem recursos não é possível prestar cuidados de saúde de qualidade e adequados às necessidades da população.

Entre 2009 e 2012, a despesa pública com a saúde sofreu um corte superior a 1700 milhões € (passou de 6,9% do PIB em 2009, para 5,9% do PIB em 2012). Entre 2010 e 2014 a redução da despesa com o SNS cifrou-se nos 1.667 milhões € (passou de 9.710M€, para 8.043M€) [dados do Ministério da Saúde].

Portugal é o 5º país onde as despesas (estatais) com saúde por habitante, em termos reais, mais diminuíram entre 2000-2011. Como consequência dos cortes na despesa pública, Portugal é o 3º país da OCDE onde os gastos das famílias com a saúde mais cresceram entre 2000 e 2011. Já em 2009, Portugal era o 4º país onde as famílias mais gastavam com a saúde, ascendendo a 4,2% do seu orçamento, quando a média nos países da OCDE era de 3,2% [dados da OCDE].

As transferências do Orçamento de Estado (OE) para o SNS têm vindo a diminuir, assim como do SNS para os hospitais públicos de “natureza empresarial” (EPE), mas curiosamente (ou não) tem-se verificado um acréscimo das verbas destinadas às Parcerias Público-Privadas (PPP)

A redução do número de profissionais está a degradar a qualidade do SNS [a “solução” tem passado pela celebração de contratos de prestação de serviços: 1869 médicos, 172 enfermeiros e 158 Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica (TDT) ou através de empresas de subcontratação/trabalho temporário (1153 profissionais, com um custo imputado de 63,2M€, só no decurso de 2012)].

O número de enfermeiros é, claramente, insuficiente. Em 2011 existiam 6,1 enfermeiros, por 1000 habitantes, em Portugal (e no SNS a média ainda é mais baixa), sendo que a média nos países da OCDE é de 8,8 por 1000 habitantes. No entanto, paradoxalmente, constata-se a existência de milhares de enfermeiros no desemprego, sendo que, destes, muito acabam por ver-se forçados a emigrar.

Um aspecto preocupante que importa alterar, reside no desequilíbrio manifesto na distribuição dos profissionais de saúde, dado que, 72% dos médicos e 81% dos enfermeiros desempenham funções nos hospitais, em detrimento dos Cuidados de Saúde Primários, quando a evidência demonstra que os últimos são mais económicos e eficientes.

Outra questão relevante prende-se com a falta de investimento na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados. Portugal continua a ser um dos países (penúltimo) da OCDE em que os custos com cuidados continuados e paliativos são mais baixos (apenas 0,2% do PIB, em 2011), o que implica menor apoio às pessoas dependentes e em situação de fragilidade (sobretudo, idosos) e aumento da despesa (tendo como consequência a permanência de muitos idosos, sem necessidade de cuidados diferenciados, em hospitais de agudos, com elevados custos para o SNS).

Mas as funções sociais do Estado, e nomeadamente o SNS, só adquirem sustentabilidade se houver crescimento económico. Se o PIB, por habitante, em Portugal (em 2012, apenas 15.791 €) fosse igual à média dos países da EU-27 (25.483 €), com “apenas” 6,6% do PIB (os mesmos 6,6% de 2012) obtinham-se mais 6.700 milhões € para investir na protecção da saúde dos portugueses.

A sustentabilidade do SNS não depende apenas do incremento dos recursos (humanos e materiais) e das transferências do OE mas também da sua gestão, em termos de eficiência e eficácia. É preciso não esquecer que os recursos disponibilizados ao SNS são finitos e resultam, essencialmente, da colecta de impostos pagos pelos cidadãos e, designadamente, pelos trabalhadores, que constituem a maioria da população portuguesa.

Defender uma utilização eficiente dos recursos no SNS é tão importante como lutar para garantir os meios necessários ao seu funcionamento, contra os cortes cegos que o actual Ministro da Saúde tem vindo a impor (desmantelando serviços para, desta forma, abrir o campo aos privados… atente-se no caso particular da região Algarvia, onde o privado tem crescido exponencialmente, à custa do encerramento de valências nos hospitais públicos).

O desperdício e a má utilização dos recursos no SNS resultam em perdas anuais de muitos milhões de euros, pelo que, é urgente alterar esta situação, nomeadamente, incentivando todos aqueles que conheçam tais situações a denunciá-las publicamente e a lutar para que sejam eliminadas. O que está em risco é demasiado importante para se ser conivente e permanecer em silêncio."

 

O que acabaram de ler parece-vos muito distante da realidade actual?!...

(Amanhã, escreverei sobre os 40 do SNS e o que mudou (ou não) nos últimos 5 anos...)

 

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